'Acabamos com a excrescência do vestibular', diz reitor da UFRJ

RIO - Depois de uma conturbada reta final de sua gestão como reitor da UFRJ, que incluiu o incêndio no Palácio Universitário e o desabamento do teto do prédio anexo de Serviço Social devido a cupins, Aloísio Teixeira volta ao campus da Praia Vermelha apenas como professor do Instituto de Economia. Grande articulador político, fez de seu pró-reitor de Planejamento e Desenvolvimento, Carlos Levi, o futuro reitor. Na última semana de um mandato marcado pela reconquista do Canecão e demolição de uma ala do Hospital Universitário, Aloísio conseguiu a aprovação do fim do vestibular da universidade e sua substituição pelo Enem. Ele faz um balanço de seus oitos anos no cargo.
Por que a decisão de acabar com o vestibular?
ALOÍSIO TEIXEIRA:Sou de uma geração que lutou a vida inteira contra o vestibular. Desde a primeira edição que participei como reitor, defendi caminhos alternativos para o acesso à universidade. O vestibular é uma excrescência do ponto de vista didático, pedagógico e social. Ele consolida os mecanismos de exclusão e foi um esforço desmontar essa máquina perversa. Não que o Enem seja isento de problemas, mas é um passo importante ter uma prova nacional. A universidade estava dividida, mas isso é natural.
Por que aumentar as cotas sociais para 30%?
ALOÍSIO:Propusemos 30% para as redes públicas, mas cuja renda familiar per capita seja de até um salário-mínimo. Mesmo que venham alunos de escolas federais, colégio de aplicação, garantimos a natureza social desta ação afirmativa. Há uma série de ações correlatas para garantir a permanência deste estudante na universidade: bolsa, transporte gratuito, acesso a equipamentos de informática etc. Acho que 30% é um percentual que implica despesas que podemos assumir sem problemas. Mais do que isso acho que é temerário.
Quais suas principais conquistas nessas duas gestões?
ALOÍSIO: Houve uma expansão de recursos grande que permite a universidade se planejar melhor, desenvolver atividades, investir em novos prédios, salas de aula, laboratórios e se modernizar. Houve um aumento exponencial de concursos para docentes e dos cursos de pós-graduação com nota máxima na Capes. Na graduação, o número de vagas cresceu cerca de 50% e foram criados 25 cursos novos, além da expansão em Macaé e Xerém. E resolvemos uma espinha atravessada na garganta da universidade que era a posse do terreno do Canecão.
Há projetos para o Canecão?
ALOÍSIO:Temos uma indicação votada pelo Conselho Universitário, no Plano Diretor, de fazer ali um centro de eventos para a cidade e a universidade. Também há possibilidade de termos uma série de equipamentos de que somos carentes, como um restaurante-escola e um teatro-escola. É preciso também discutir um modelo de gestão. O terceiro problema é como financiar. Não há chance de privatização. É claro que aquilo ali é ouro em pó. Um terreno daquele tamanho na Zona Sul do Rio é alvo de cobiça. Se a universidade rapidamente não definir um projeto, pode perder aquilo ali.
E os entulhos do Hospital Universitário?
ALOÍSIO: Isso era outra espinha na garganta da universidade. Já nos anos 70 foi discutida a demolição de uma parte. A estrutura vinha se deteriorando. Fizemos um diagnóstico com a Coppe dos problemas estruturais, mas não havia jeito, era preciso derrubar. Foi doloroso. Sobre o entulho, abrimos uma licitação para retirada, mas circulou a informação de que poderíamos vendê-lo. Suspendemos a licitação, mas só a Cruz Vermelha se interessou. Estamos negociando para eles levarem e nós não pagarmos nem recebermos.
O que faltou concretizar em oito anos de gestão?
ALOÍSIO: Temos que avançar na expansão de vagas e consolidar formas de acesso à universidade para que sejam menos excludentes e impeditivas. Há uma assimetria na universidade entre as áreas de ciências duras (tecnologia) e as de humanidade e ciências sociais. Estas últimas foram pouco contempladas no passado. A universidade só se integrará de fato e dará um salto de qualidade se as ciências sociais e de humanidade permearem todas as atividades de ensino e pesquisa de extensão.
O projeto não realizado de transferir todos os cursos para o Fundão contribuiria com isso?
ALOÍSIO: O maior problema da UFRJ é a fragmentação. Estar espalhada pela cidade é ruim, mas só juntar não resolve. A UFRJ é um mosaico de microssucessos, como a Coppe e a Faculdade de Medicina. São sucessos individuais, mas quando você junta tudo, não conseguimos nos tornar uma verdadeira universidade. Há conjunto de razões para defender a vinda ao Fundão: ocupamos prédios históricos, e as unidades neles localizadas teriam instalações melhores.
E o que seria feito do campus da Praia Vermelha?
ALOÍSIO:É uma situação mais complexa. Não podemos usar o palácio universitário do jeito atual, pois estamos promovendo a destruição de um patrimônio arquitetônico do Rio. Temos espaço para construir no campus, mas precisamos pensar na integração dos estudantes das diferentes áreas do conhecimento. O ônus do deslocamento entre os campi é do estudante. Ninguém quer vender nem privatizar nada. Queremos usar a Praia Vermelha como espaço público. Vencido esse primeiro momento, o bom senso vai acabar imperando.